Pense Nisso

‎"Não é demonstração de saúde ser bem ajustado a uma
sociedade profundamente doente"
Jiddu Krishnamurti

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Final de Ano com poesia..

Passagem do ano O último dia do ano não é o último dia do tempo. Outros dias virão e novas coxas e ventres te comunicarão o calor [da vida. Beijarás bocas, rasgarás papéis, farás viagens e tantas celebrações de aniversário, formatura, promoção, glória, [doce morte com sinfonia e coral, que o tempo ficará repleto e não ouvirás o [clamor, os irreparáveis uivos do lobo, na solidão. O último dia do tempo não é o último dia de tudo. Fica sempre uma franja de vida onde se sentam dois homens. Um homem e seu contrário, uma mulher e seu pé, um corpo e sua memória, um olho e seu brilho, uma voz e seu eco, e quem sabe até se Deus... Recebe com simplicidade este presente do [acaso. Mereceste viver mais um ano. Desejarias viver sempre e esgotar a borra dos [séculos. Teu pai morreu, teu avô também. Em ti mesmo muita coisa já expirou, outras [espreitam a morte, mas estás vivo. Ainda uma vez estás vivo, e de copo na mão esperas amanhecer. O recurso de se embriagar. O recurso da dança e do grito, o recurso da bola colorida, o recurso de Kant e da poesia, todos eles... e nenhum resolve. Surge a manhã de um novo ano. As coisas estão limpas, ordenadas. O corpo gasto renova-se em espuma. Todos os sentidos alerta funcionam. A boca está comendo vida. A boca está entupida de vida. A vida escorre da boca, lambuza as mãos, a calçada. A vida é gorda, oleosa, mortal, sub-reptícia. ANDRADE, Carlos Drummond de. "A rosa do povo". In: Poesia completa.. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002.

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Porque a esquerda me incomoda.

Passando em frente à sede de um sindicato qualquer me deixou muito incomodado o fato de toda a fachada do prédio estar estar ocupada com a imagem do provável presidente do sindicato com o microfone em punho numa pose agressiva de liderança em formação de ataque. Comecei a pensar a esquerda e a forma como ela se apresenta para as pessoas. Enquanto a URSS vendia a imagem de líderes fortes, pessoas que poderiam alavancar e construir com punhos de aço uma nação de trabalhadores, a América (aquela do norte) sempre vendeu a ideia da liberdade, a ideia do livre a arbítrio e da livre iniciativa, a qualidade de poder "decidir" o que você quer fazer ou não da sua vida. Não interessa aqui se esta visão é errada ou não, e sim tentar entender o porque a esquerda se esforça em repetir este mesmo erro. Em um curto espaço de tempo temos o exemplo do Lula, levantado como o novo grande salvador da Nação, chegando a ponto de se tentar um processo de getulificação de sua imagem, dedicando a essa figura uma "Era", e a recente experiência da neo-esquerda carioca inspirada pelo Marcelo Freixo, líder carismático e portador de uma imagem impecável. Na minha opinião (ai começa a polêmica) a esquerda socialista carece historicamente de ideias e sempre promoveu o culto a imagem de suas lideranças como um ponto primordial. A esquerda carece de ideias, não de intelectuais, diversos na verdade se encantaram com o pensamento e ajudaram a validar o pensamento socialista. É preciso porém ideias que alcancem o senso comum, a esquerda nunca se desprendeu (no Brasil) das classes médias urbanas, salvo raríssimas exceções. A esquerda socialista tem dificuldade de se comunicar com o povo, talvez pela experiência soviética ele nunca se preocupou com este expediente, ferramenta importante ao lidar com o povo numa democracia estabelecida. A esquerda carece de ideias e possui líderes em excesso, a ponto de se fragmentar em inúteis divisões internas. O problema de se fixar em imagens é que elas não são intangíveis. A publicização dos crimes de Stalin reduziram a capilaridade da URSS e Lula e suas "trapalhadas" quase jogam a imagem de um governo mais aproximado da população no lixo. Uma eventual descoberta de um desvio de conduta sequer do parlamentar Freixo acabaria com qualquer esperança de mobilização da população por um governo diferente, é preciso urgentemente mudar o enfoque. Máscaras caem o tempo todo, ideias resistem.